segunda-feira, 31 de maio de 2010

Cheguei até aqui!

Nos últimos posts muitos novos leitores tem frequentado minha caixa de mail, com suas histórias e dúvidas . Principalmente acham o blog animado, feliz e se identificam com minha transmissão de pensamentos em palavras.


A primeira postagem do blog data do dia 2 de Dezembro de 2008 (http://hodgkineuconheoestecara.blogspot.com/2008/12/como-entrei-para-turma.html) e conto como ENTREI PARA TURMA, das pessoas que tem ou tiveram câncer. Sim, porque é mais ou menos uma turma, nos reconhecemos e sem querer nos achamos no meio da multidão e sem querer estamos na casa um dos outros nos apoiando. Através do blog e do orkut conheci muitas pessoas, sabemos que estamos, mais ou menos, no mesmo barco. Mais ou menos, porque existem tipos de câncer diferentes, estágios diferentes e diferentes maneiras de lidar com a enfermidade.


Quando se reconhece alguém da turma, normalmente existe uma gana para dizer o quanto “andei para chegar aqui até”, mil palavras por segundo… De diagnóstico a fim de tratamento, rápido……. Aí, se fala dos sentimentos, dos medos, das provações, dos avisos, da procura do porque, da fé, da morte… Em 90% dos casos existe a necessidade superficial de se mostrar forte.

Existe uma “cultura” e “industria” do câncer. De medicamentos novos, de exames em máquinas que parecem ter saído de algum filme de ficção científica, de novas pesquisas diárias que parecem a qualquer hora anunciar a cura definitiva, outras que a primeiro momento são anunciadas no Jornal Nacional e depois são testes que não passam das cobaias, técnicas espirituais de regressão, de cirurgias por médiuns, controle espiritual agudo, pastores que tratam o paciente de câncer como cobaias espirituais e todo tipo de religião que se aproveita da fragilidade para conquistar um fiel e livros, montanhas deles que ensinam dietas, cura e auto-ajuda “canceriana” ou “cancerígena” (estou criando esta definição agora, se existe me perdoem, mas, acho que cancerígena seria a auto ajuda que causa câncer , não deixa de ter um sentido… Mas, para evitar subjetividades, fica denominado AUTOAJUDA CANCERIANA).


Esta quase lei utopica, heroica e comum de dizer por ai que se está “COMPLETAMENTE A VONTADE COM O CANCER, PORQUE SEGUNDO PESQUISAS O OTIMISMO DO PACIENTE O CURA…e BLABLABLA”, é um grande tumor exposto, com dores latejantes, irritante e supuração amarela!

Quando se descobre um câncer, a tendência é associar a idéia de VOCÊ CAUSAR O CANCER EM VOCÊ, não adianta quererem me dizer que “estudos provam….” que o câncer é magoa, é rancor, é insatisfação pessoal, NÃO ACEITO. Quando descobri a doença sim, no primeiro momento meu inconsciente coletivo fez que me culpasse por aquilo que tinha feito comigo. Depois, abaixada a poeira do choque: mentira, eu não fiz isto comigo, não causei a doença! Ela surgiu. Procurei explicações científicas para isto, elas existem. E procurei explicações empíricas, como a sincronicidade dos acontecimentos em nossas vidas, razões espirituais da nossa evolução humana ou ainda sermos partes e todo de algo maior que nos une a um amor maior: Deus. Ou quando tudo não explicava nada, fui e sou pragmática: as coisas acontecem e enfrentamos, certo?

Depois, da AUTOAJUDA CANCERIANA nos pregar na cruz, apontando como culpados pela doença, ela, nos diz que: “ se você causou a doença em você, você também é responsável por tirá-lo de dentro de você” , e é aí, que vem as frases de efeito, os clichés pregados em parachoque de caminhão, aí está os sorrisos amarelos e a imensa CULPA por se estar com medo, tristeza e preocupação.


Vou explicar.


Já ouvi muito: pessoa descobre a doença: estou bem, estou forte, estou tranquilo. Depois se começa a quimioterapia: tranquilo, tive uns efeitinhos, não é um bicho de 7 cabeças. Cabelo cai: a não tranquilo, não liguei, cabelo cresce… Transplante de medula? Tranquilo! UTI? Balada das boas. Cirurgias extensas para retirada de tumor? Tranquilo como ir até a esquina, e aí se vai a necessidade desumana de se provar para si e para o mundo que você vai se curar pelo seu pensamento positivo, que você faz parte da turma que é positiva.


Completamente desumano com quem lê, com quem convive, com quem se espelha, com quem busca a cura. Porque se você se senti com medo e de repente cai nesta “cultura da felicidade e positivismo”, começa a se CULPAR novamente por não ser este GUERREIRO DE LUZ E FORÇA que tudo a volta está te exigindo!


Existem inúmeros livros com esta autoajuda cruel de felicidade e positivismo a qualquer custo, existem comunidades no orkut que as pessoas falam do câncer e dos sofrimentos como se mesmo o câncer fosse COR-DE-ROSA. E sempre vou dizer, por mais que me contestem, que não é por aí, que não somos culpados e muito menos heróis. O que nos cura é descobrir rápido a doença, os remédios que tomamos, e que nos trazem efeitos colaterais ruins, e sim a FORÇA, a força de também se admitir que somos humanos, que precisamos de colo nos momentos de medo, que precisamos de AJUDA para caminhar, AJUDA para tomar banho , AJUDA para se alimentar bem, AJUDA para fazer necessidades biológicas ora, moles como agua, oras, duras de chorar, AJUDA para nos sentirmos amados e necessários e AJUDA para estar felizes genuinamente. A AJUDA que não está nas frases clichés, nem na curiosidade fantasiada de preocupação, nem na superficialidade de quem se diz contente por estar com câncer e muito menos no altruísmo de quem quer medir a própria felicidade pelo seu sofrimento.


Quando criei o blog não foi para ser uma fonte científica para pacientes com câncer, nem uma fonte de AUTOAJUDA CANCERIANA, nem um diário, não tinha objetivos com o blog , queria apenas escrever sobre o que estava sentindo. Depois de quase 2 anos de blog, mais de 3000 acessos e inúmeros novos contatos e amigos, digo que ter tido câncer não foi um premio em minha vida, enfrenta-lo não foi um ula-ula e estar curada é seguir a vida. Somente.


Para os novos visitantes , meu mail de contato é rsrenatas51@gmail.com, se quiserem dividir sentimentos e se encontrarem nos medos e hilariedade da vida existem inúmeras postagem antigas da época que estava em tratamento e de quando retomei a vida, aí sim, todos poderão entender e compartilhar as milhas de percorri para chegar até aqui!

Você não sabe

O quanto eu caminhei

Prá chegar até aqui

Percorri milhas e milhas

Antes de dormir

Eu nem cochilei

Os mais belos montes

Escalei

Nas noites escuras

De frio chorei, ei , ei

Ei! Ei! Ei! Ei! Ei!...


(tony guarrido)

2 comentários:

Encontrando Dr. Hodgkin disse...

Concordo contigo, Renata, minha amiga impermeável.

Escrevi antes, mas na hora de me identificar perdi tudo, rsrs.

Bom... preciso ainda refletir e amadurecer meus pensamentos sobre esse texto para fazer o que me pediu, e vou fazer. É até bom você pedir que eu escreva, ando um tanto sem idéias de assuntos para o blog, e esse é bem interessante, com certeza ajuda quem está passando pelos tratamentos a não se sentir tão sozinho, tão isolado, essa empatia ajuda a superar os momentos difíceis e galgar os degraus até a cura com mais ânimo.

Beijos

Carin

Pati Georg disse...

Olá Renata... Me chamo Patrícia e acho que faço parte desta "turma" que como vc disse é bem ampla, meu caso não é linfoma e sim melanoma, eu quando soube do meu problema fiquei um pouco paralisada mas fui colocando as ideias no lugar e fiz um blog também, tenho prourado e encontrado blogs como o seu que fazem com a gente não se sinta a unica no mundo com problemas, e o melor de tudo que fazem com que a gente consiga dar e receber força de quem como nós sabe exatamente o quanto caminhamos pra chegar até aqui! Aguardo sua visita no meu blog... se não tiver problemas gostaria de por seu blog entre os meus links... Grande abraço