segunda-feira, 28 de junho de 2010

O meu deserto, a minha nova estrada....

O câncer foi a minha retirada (estratégica a francesa) para o deserto para meditar. Foi assim que no começo da minha procura espiritual classifiquei esta, retirada de cena, como o MEU DESERTO… Porque são assim as grandes mudanças na vida ou no mundo, com retiradas estratégicas para meditar sobre novas e importantes condutas e decisões.

Foi consciente do meu deserto que entendi que algumas atitudes e condutas na minha vida deveriam ser repensadas, e, o principal era direcionar minha energia em excesso para meu lado espiritual. Tem sido assim desde então, buscando tantas mudanças, nadando contra-corrente em busca de coisas que tem realmente importância, mas, focada no que neste momento é a minha prioridade: espiritualidade!

Sim, estou fora de contexto. Não é o que a volta grita-se para ser feito, a corrente nos envolve em uma roda vida de IDEAIS de felicidade e comportamento padrão, e, por isto, sinto-me completamente a margem de algumas situações, conversas e lugares. Não importa, absolutamente, não importa, me encontrar espiritualmente e colocar-me em um posicionamento que eu julgo ideal no coletivo é e tem sido a meu principal objetivo.

Estes dias, participei de uma discussão sobre uma paciente de câncer que tinha conflito com pessoas a volta que indiretamente cobravam dela uma postura “BOAZINHA” perante a vida e ela dizia que não tinha se tornado mais “boazinha” e estava se sentindo culpada por isto. O que achei interessante desta discussão, foi que todas as pessoas que responderam, negaram que se sentiam mais boazinhas pós-cancer e sim mais: OBJETIVAS, RACIONAIS e PRAGMÁTICAS.
Bingo! E agora? Não saberia explicar psicologicamente o mecanismo destas mudanças de postura para quem passou por esta doença, mas, talvez…

(primeiro), o fato de ter que enfrentar a doença, que trava com você uma guerra psicológica, nos força a pensar racionalmente sobre as armas e simplesmente atacar!
(segundo), ser privado de inúmeras coisas nos faz dar valor em coisas que realmente tem importância nesta vida e isto nos torna intolerantes a detalhes mesquinhos e dramáticos da vida.
(terceiro), o orgulho cai por terra abaixo, e se sentir completamente HUMANA, nos faz não ter medo de assumir posturas, riscos, qualidades/defeitos e condutas, sejam estes contrários as regrais sociais a nossa volta…

Isto não faz de ninguém bonzinho e assim como a minha colega “loira-linda”, não me sinto boazinha. Ter neste momento como prioridade minha vida espiritual mostra como estou agindo racionalmente atrás do que não se pega, não se compra e não se vê e justamente por ser uma mulher racional e pragmática, tem sido uma busca árdua e dedicada.
Foi desta maneira, estando neste caminho, que surgiu um convite para participar da Sociedade São Vicente de Paulo, uma organização de leigos católicos que está espalhada para todo mundo a mais de 200 anos, que tem como principal objetivo seguir os ensinamentos de Jesus Cristo na prática do amor e da CARIDADE.

O maior ensinamento de Jesus foi o amor, amar a todos! Mas, pensava comigo, amar a mãe, o pai, o namorado, os irmãos, os parentes e ir na missa e rezar….. é isto? É isto???? É só isto??? Isto para mim não era suficiente e conheci a prática do amor, o exercício da vida plena em amor que Jesus nos deixou é sim a base para religiões cristãs e ter DOAÇAO a pessoas que não existem laços sentimentais, isto sim precisa ser a PRÁTICA cristã.

Sou uma consócia da Sociedade São Vicente a alguns meses. E estar neste grupo de pessoas é a minha prioridade no momento.

Conheci novas pessoas da minha Conferencia ( a Sociedade é formada por Conferencias que são um grupo de pessoas que direcionam o trabalho vicentino), pessoas de todo os tipos e idades e aprendi a admira-las pela doação ao próximo! É uma rede de caridade, que nunca sonhei que existia…

Então é assim, nos reunimos uma vez por semana para rezar e discutir sobre as visitas domiciliares que fazemos a pessoas carentes. Nestas visitas levamos conforto espiritual e tentamos identificar as carências materiais e entrar em grupo, resolvê-las.
E é assim, a prática do amor é contagiante! Ajudamos os que precisam, mas, nos ajudamos a ver que não precisamos de muito, só o necessário, nos ajudamos a também a nos tornar melhores dentro da nossa casa, no nosso trabalho, com nossos amigos, porque entendemos a importância da valorização do que temos a nossa volta.

Esta convivência tem sido maravilhosa e reveladora em minha vida. Tenho descoberto em mim amores por todos os cantos na capacidade de me doar e tudo o mais, não tem mais grande importância….

Em um destes domingos, nós, mulheres da nossa Conferência Vicentina, organizamos uma visita no asilo, chamamos a visita de CLUBE DA LULU (zinha) CHARMOSA, e foi mesmo a consolidação do meu desejo de estar nesta Sociedade.

Foi uma folia de alegria, risos, cores, cheiros, toques, gostos e olhares, uma grande festa da AFETIVIDADE feminina… Conversamos em pé de orelha, descobrimos um pouco da história de cada uma, vimos aos poucos se entregaram as nossas mãos cheias de carinho, desejando serem cuidadas e amadas. Nem todas puderam participar… Nem todas quiseram participar…. Algumas olharam nosso movimento e alegria de longe, foram vindo, vindo…. nem que fosse para saborear bolos DELICIOSOS que as consócias prepararam!

Uma não queria o cabelo vermelho, de resto…. nos permitiram tudo!!! Cabelos avermelhados, acobriados, cabelos completamente brancos que sem grandes problemas viraram castanhos, unhas vermelhas “maça-do-amor”, ou com desenhos de flores, massagem nas mãos, chapinha e baybe-liss, maquiagem a escolher em cores, baton muito baton vermelho e tiraram sobrancelha, sem um gritinho de dor! E um grande finale com bijus coloridas distribuídas para todas. Tinha tudo que mulher gosta! De esmalte vermelho a bolos deliciosos para comer entre um e outro trabalho.

Lindas, ficaram lindas. E com sorrisos por todo os rostos…

Foi assim, entre olhares de “eu não acredito” e “sim, eu acredito” , olhares que se encharcavam não se sabia de felicidade ou de emoção, que passamos uma tarde de domingo. Reunidas entre nós consocias, trabalhando juntas, profissionais, universitárias, donas de casa, estudantes, ali, SERVINDO e cuidando….Foi impossível não perceber a paz incrível do ambiente pela união na prática do evangelho do amor.

Não conseguiria descrever neste post em poucas e resumidas palavras o quando me emocionei. Lembrei tanto, tanto da minha vida antes de ter câncer, lembrei tanto da quantidade de amor e carinho que recebi quando estava frágil e quando fomos embora quando elas me abraçaram e disseram DEUS TE ABENÇOE, só conseguia responder com os olhos cheios de água: ele me abençoou e está me abençoando….

Só tenho que agradecer ao meu deserto, por ter feito eu descobrir que precisava mudar minha vida e que precisaria ajudar outras pessoas a mudar as suas, agradecer aos meus amigos da Sociedade S. S. de Paulo, que me consolidaram a importância dos principais valores humanos e por isto me faz adorar estar e trabalhar com eles e agradecer a Deus, por através nas minhas orações estar me auxiliando a conduzir meus caminhos, dentro da racionalidade, por uma paz espiritual completa e inspiradora.

Não o câncer não me tornou boazinha.... me tornou humana.
(Abaixo fotos, das mocinhas que cuidamos, minhas e das consócias companheiras deste trabalho e de momentos especiais que vivemos...)




















(antes e depois ( de 2 delas, fiu-fiu)



(para quem quiser conhecer mais do nosso trabalho: http://vicentivando.blogspot.com/ e para quem quer conhecer a SOCIEDADE SÃO VICENTE DE PAULO: http://www.ssvpbrasil.org.br/ )

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